Trancamento da Ação Penal em Crimes Tributários: STJ Rejeita Denúncia Genérica Contra Administrador de Empresa
Em decisão proferida no RHC nº 167952/PB, o Ministro Reynaldo Soares da Fonseca trancou ação penal por crime tributário ao reconhecer que a mera condição de administrador de empresa não justifica denúncia criminal sem a descrição específica das condutas delitivas.
Contexto
O caso envolveu administradores da empresa TEMAPE (PETROVIA) denunciados pelo crime previsto no art. 2º, II, da Lei 8.137/1990, por supostamente deixarem de recolher ICMS nos meses de novembro e dezembro de 2015, com prejuízo estimado em R$ 3,5 milhões.
O Tribunal de Justiça da Paraíba havia negado a ordem de habeas corpus, entendendo que a denúncia preenchia os requisitos do art. 41 do CPP, o que foi reformado pelo STJ.
Fundamentos
- Requisitos da denúncia válida: Não basta indicar a posição hierárquica do acusado na empresa; é necessário descrever condutas específicas atribuíveis ao administrador.
- Vedação à responsabilidade penal objetiva: A mera condição de administrador não configura autoria delitiva sem demonstração de ações ou omissões dolosas.
- Garantia da ampla defesa: Denúncia genérica impede o adequado exercício do contraditório ao não delimitar quais condutas devem ser refutadas.
- Excepcionalidade do trancamento: Embora seja medida excepcional, o trancamento é cabível quando demonstrada, de plano, a inviabilidade da acusação.
Trechos relevantes da decisão:
“Sobre esse tema, embora o Tribunal de origem tenha afirmado que a peça inaugural atende aos requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, não é possível extrair, de sua leitura, fatos ou condutas praticadas pelo recorrente que permitam concluir pela prática de ações ou omissões dolosas que tenham sido relevantes para a produção do resultado lesivo indicado na denúncia.”
“Não se pode admitir a propositura de ação penal sem que haja a mínima indicação das condutas delitivas perpetradas, de modo a permitir que a defesa escolha as estratégias que julgar adequadas para infirmar a narrativa acusatória.”
“A denúncia genérica e abstrata dá causa à inversão do ônus probandi, haja vista que a ausência de descrição mínima da conduta imputada ao acusado, bem como do fato ocorrido, em última análise implica a incumbência de o denunciado demonstrar a não participação no ilícito penal, o que revela violação do exercício da ampla defesa e do contraditório.”
Implicações práticas para empresários e administradores
A decisão representa importante salvaguarda para administradores de empresas, estabelecendo que:
- O não recolhimento de tributos pela empresa não implica automaticamente responsabilidade criminal dos gestores
- O Ministério Público deve demonstrar qual conduta específica de cada administrador contribuiu para o resultado delitivo
- A defesa pode requerer o trancamento da ação penal quando a denúncia for genérica
- A posição hierárquica, por si só, não configura elemento suficiente para responsabilização penal
Estratégias defensivas em crimes tributários
Esta decisão reforça a importância de estratégias defensivas focadas na análise da peça acusatória, especialmente:
- Verificação minuciosa da individualização das condutas
- Impugnação de denúncias baseadas apenas em presunções hierárquicas
- Demonstração da ausência de nexo causal entre as ações do administrador e a sonegação
- Questionamento do elemento subjetivo (dolo) na conduta administrativa
Importante: O STJ ressalvou a possibilidade de oferecimento de nova denúncia, desde que respeitados os requisitos do art. 41 do CPP, demonstrando que não se trata de impunidade, mas de garantia do devido processo legal.